Parecer emitido sobre alegação de dano ambiental devido à projeção de sombra em área de praia como motivo determinante para não construção de prédio no município de Penha/SC

I – ANÁLISE SOB O PRISMA AMBIENTAL

Ocorreu na cidade de Penha/SC a audiência pública com exposição do Estudo de Impacto de Vizinha de um prédio a ser construído nesta mesma cidade, em que algumas pessoas opinaram pela inviabilidade com o argumento que a projeção de sombra do edifício causaria dano ambiental. Por conta disto, solicitaram à esta Comissão um parecer. É o relatório.

Preliminarmente, convém esclarecer que, de acordo com a Resolução CONSEMA n° 98, de 05 de maio de 2017, os condomínios residenciais ou em edifícios, ou mistos com comerciais, são considerados como atividades sujeitas ao Licenciamento Ambiental, que é um processo administrativo que analisa, através dos Estudos Ambientais e projetos, os impactos que serão causados pelo empreendimento, bem como as medidas mitigadoras e o viabiliza por meio das licenças ambientais, ou, não sendo este o caso, reconhece como inviável sob o aspecto ambiental, indeferindo as licenças.

Esta análise não é feita com base nos termos do Licenciamento Ambiental, aliás, sequer tivemos acesso a tais documentos, e recomendamos que qualquer análise aprofundada sobre o tema, deve necessariamente ser realizadas com base no Licenciamento Ambiental. A análise apresentada aborda somente as ilustrações do Estudo de Impacto de Vizinhança e visa responder o questionamento sobre a sombra, à luz do entendimento desta comissão, sem prejuízo de outras conclusões, principalmente por não ser uma análise técnica sobre o impacto ambiental. Posto isto, analisa-se a questio.

De acordo com a Resolução CONAMA 01/86, considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam a saúde, a segurança e o bem-estar da população, as atividades sociais e econômicas; a biota; as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; a qualidade dos recursos ambientais.

O Impacto pode ser positivo, ou negativo, justamente, diferente do dano ambiental, lembrando que dano pode ser conceituado como a lesão a um bem jurídico tutelado, portanto, o dano ambiental é a lesão ou degradação praticada contra o Meio Ambiente.

Ab initio, o EIV (Estudo de Impacto de Vizinhança) informa que o empreendimento contará com um área no subsolo e outros 32 pavimentos. Com uma altura considerável, projetará sombreamento sob vários imóveis bem como sobre a praia, e consequentemente, sobre a vegetação que estão nestas áreas. Abaixo seguem duas imagens retiradas do EIV, a primeira, referente ao solstício de inverno, e a segunda, referente ao solstício de verão.

Inquestionavelmente, tanto a implantação do empreendimento, bem como o uso posterior causarão impactos ambientais de diversos modos ou tipos, entretanto, uma análise mais aprofundada deve ser realizada quanto à hipótese destes impactos serem geradores de dano ambiental.

Entende-se que a análise considerar diversos fatores, tais como, a densa antropisação do local, e o uso da área afetada. Por exemplo, nas duas imagens verifica-se que a região é habitada e várias residências estão no local. Algumas extremando com a orla, e consequentemente, com a área em que ocorre ou deveria ocorrer vegetação de restinga.

Não é possível, apenas pelo EIV, concluir que estas residências já presentes, não projetem, hora alguma do dia ou época do ano, sombras sobre a vegetação ali presente. Ainda, a região é conhecida e utilizada para atividades físicas dos munícipes. Alguns locais apresentam vegetação descaracteriza, tais como gramíneas, ou outras exóticas que se configura como vegetação de restinga.

Como sabido, em épocas do ano, o mar causa o assoreamento da areia da praia, formando pequenas escarpas, popularmente chamadas de barranco. Estes escarpas causam inclinações que alteram o ângulo de incidência solar, também projetando sombras em certos momentos. E além disto, há morrarias próximas que também projetam sombras na orla, vide, por exemplo, o início da praia do Quilombo, por exemplo, na Rua José Inácio da Silva, e mesmo com o sombreamento, a vegetação de restinga cresce na região.

Também considerando os dados do EIV, percebe-se que o sombreamento não ocorre durante o dia todo, mas em alguns momentos do dia, em certas estações climáticas, e por algumas horas. Neste aspecto, é necessário analisar que, a incidência de raios UVA se faz notória das 07h às 11h, e das 14h30min às 17h, enquanto que os raios UVB se intensificam das 10h30min às 15h.

Além do mais, analisando a Figura 2, que trata-se do solstício de verão, nota-se que ela projeta sobre um local em que atualmente conta com instalação de uma lanchonete, na praia, e ao lado sul, localiza-se um indivíduo arbóreo, smj, terminalia catappa, conhecido popularmente como Sete Copas, projetando sombra a todo instante na região, impedindo que a vegetação de restinga consiga sobreviver.

Sem falar que esta área da lanchonete recebe muita procura por banhistas pois localiza-se em frente a algumas pedras que adentram ao mar e servem como um molhe natural, impedindo formações de ondas fortes, o que atrai banhistas, que instalam suas cadeiras e guarda-sóis, e ali permanecem durante sua recreação.

Nota-se que, para apontar que o sombreamento causará um dano ambiental, necessário estabelecer alguns critérios técnicos ou científicos, tais como, quanto tempo de exposição solar é necessário para a vegetação do local, se existe vegetação de restinga de área de sombra, qual o sombreamento atual da região, caso ocorra, em quais horários se dão os episódios, com ou sem o prédio, se haverá vegetação na área, considerando o uso do solo pela ação antrópica, etc.

Ex positis, conclui-se que, salvo melhor juízo, aventar hipótese de dano ambiental pelo aspecto isolado de que o empreendimento projetará sombra em área de vegetação de restinga não é o melhor acerto, tendo em vista que a região é antropisada, cuja vegetação recebe atualmente diversos impactos (lixos, espécies exóticas de fauna e flora, etc), além de que não há nenhum relatório que demonstre que o tempo de exposição à sombra seja de fato nocivo à vegetação ou que já não ocorra sombreamento efetuado por imóveis extremados, morrarias, ou árvores plantadas.

O entendimento é que somente um estudo ambiental, com base em conhecimento científico, muito mais detalhado é que poderia apontar se ocorre dano ambiental à flora da orla praiana devido à projeção de sombra do empreendimento. É o parecer.

ANÁLISE SOB O PRIMSA URBANÍSTICO – PLANO DIRETOR

Como visto acima, a questão ambiental correlata ao sombreamento, não é óbice a priori para a feitura de empreendimentos de tal dimensão/porte.

A questão volta-se mais para critérios urbanísticos, critérios que a comunidade de uma urbe define que deseja que seja sua vizinhança, sua comunidade, sua cidade.

São dos critérios urbanísticos que a cidade vai definir onde deseja e se deseja adensar, os locais que deseja que sejam paisagisticamente e ambientalmente protegidos, as vias preferenciais para onde deseja que o trânsito escoa, os locais residenciais, comerciais e industriais. Os locais que deseja que sejam alocados instalações necessárias, todavia não desejáveis (lixões, presídios, tratamento de esgoto e etc…), os locais que deseja concentrar a administração pública e muitas outras questões.

Numa cidade balneária como é Penha/SC, uma cidade que tem intensa atividade turística, que tem em suas praias o mais relevante ativo econômico, ativo esse que possui sua relevância em maior parte por conta da atividade turística, é natural que ao regular aspectos urbanísticos, em grande medida tais regulamentos irão dispor sobre o uso da praia ou de questões que causem algum impacto em suas praias.

A competência primária para legislar sobre questões urbanísticas é da União e dos Estados membros, todavia conforme incisos I e II do art. 30 da CF/88, cabe também aos municípios legislarem sobre tal temática, desde que sejam questões locais e suplementares a legislação federal e estadual. A Constituição Estadual de SC em seu artigo 141, bem como nos incisos I, II e VIII do art. 112, também dá competência dos municípios legislarem sob o tema.

Além das competências constitucionais, cabe destacar também o Estatuto das Cidades, que em seu diploma normativo, regulamenta uma série de competências urbanísticas, de uso do solo e ordenamento territorial aos municípios.

Em conclusão, possuem os municípios em normatizar os seu ordenamento territorial, o uso do solo, possui o município competência para disciplinar e planejar a cidade.

II.I. GABARITO GERAL NO EIXO ORLA

No anexo VI, na tabela denominada “Parâmetros Urbanísticos para o ocupação do solo nas macrozonas, zonas, setores e eixos”, constam a limitações de pavimentos, de altura, de parcelamento de lote e outras questões correlatas.

No caso em específico estamos à tratar de um imóvel que está localizada no EIXO ORLA, que permite gabarito LIVRE no local.

II.II. GABARITO ESPECÍFICO NA FAIXA PRAIAL DO EIXO ORLA

Em que pese o Eixo Orla não traga restrições de pavimento/gabarito em sua área, todavia existe uma limitação específica e sobreposta na região do Eixo Orla que é a Faixa Praial. Na região do empreendimento a Faixa Praial do local é aferida pela Faixa B da Tabela do Anexo VI denominada “Detalhamento dos Parâmetros para o Setor de Preservação da Paisagem Turística da Faixa Praial”.

A regulamentação para aferição do início da contagem da área de afetação das limitações das Faixa Praial é “A Linha de Referência é a média entre a Faixa de Areia e a Faixa de Vegetação que será implantada através de coordenadas pela Prefeitura Municipal de Penha”. Enfim independente da formalização e implantação desta linha média pelo poder público municipal (que é necessário para exigir-se o cumprimento da lei), para o caso em tela parte-se do pressuposto de sua existência e que portanto a contagem da metragem desta linha se dá em algum ponto no praia.

Veja que a Faixa B possui um escalonamento de limitações de pavimentos, começando com a limitação de até 21 metros de distância da orla/praia, depois de 26 até 40 metros de distância, depois de 40 até 60 metros de distância, por fim de 60 até 100 metros de distância.

Cabe um destaque, pois a legislação (tabela) traz algumas debilidades, pois note-se que a primeira limitação é até 21 metros, depois acima de 21 metros e até 25,99 metros de distância ficam num limbo, sem nenhuma limitação! Também se destaca que posterior as limitações escalonadas falam em 26 até 40 metros, posteriormente de 40 até 60 metros, fica então uma dúvida da aplicação da norma caso o empreendimento de 40 metros. Deve respeitar a limitação maior de 26 até 40 metros, ou a limitação mais branda de 40 até 60 metros? Assim ocorre sucessivamente conforme avança o escalonamento.

II.III. EIV – FAIXA PRAIAL

O Estudo de Impacto de Vizinhança apresentado pelo empreendedor (página 52 do referido EIV) apresenta informação de que o empreendimento está a menos de 100 metros da praia.

Se estiver a menos de 100 metros da praia, portanto sofre interferência das limitações da FAIXA PRAIAL, conforme abordamos no item acima. No menor nível de limitação, o gabarito não explicita se o número de pavimentos é 1 (térreo), 2 ou mais pavimentos, simplesmente não apresenta nada, podendo gerar a interpretação que não dá limites ao número de pavimentos, como também que o número de pavimento seja tão somente de 1 (térreo).

Todavia existe a limitação de altura máxima das construções, que no caso na menor limitação fica em 20 metros de altura.

II.IV. GOOGLE EARTH – FAIXA PRAIAL

Conforme aferição realizada pelo Google Earth por este parecerista (portanto não se trata de uma aferição técnica e muito menos precisa), a distância de 100 metros medido da praia, vai dar na Av. Antônio J. Tavares, portanto à priori não chegando no empreendimento.

II.V. CONCLUSÃO ITEM II

O município de Penha/SC, por seu plano diretor, entendeu por bem proteger a paisagem turística que são as suas praias. Um dos meios que realiza tal proteção, é por meio de limitação de gabarito/altura das construções, minorando assim o impacto da antropização, protegendo a paisagem turística, protegendo inclusive a praia da incidência demasiada de sombra durante o dia.

Tal regulamentação não deve e nem pode ser aleatória, casuística, deve portanto ter regras erga omnes, de forma que todo cidadão/empreendedor possa de antemão saber se possui o direito de empreender em tamanho porte/dimensão.

Assim fazendo o município de Penha/SC, em seu Plano Diretor, estabeleceu que na faixa praial a altura máxima da Faixa B não poderá passar de 20 metros. Cabe no caso a controvérsia mencionadas no subitens II.II e II.III.

Caso o empreendimento esteja dentro da área delimitada da Faixa Praial, fica portanto constituído o impedimento para realização de tal empreendimento, vide o fato de estar em conflito/discordância com os regramentos do Plano Diretor.

Todavia caso o empreendimento esteja localizado em área fora da faixa praial, então primeiramente deve-se retificar o EIV e realizar nova Audiência Pública para apresentar o referido EIV. A mera retificação sem a realização de nova Audiência Pública, não permite a homologação/permissão do empreendimento, pois o EIV apresentado é o único que oficialmente existe, e portanto no EIV existe consta informação de que o empreendimento do jeito que está, não pode ser empreendido.

Parecer da Comissão de Direito Ambiental da Subseção Balneário Piçarras da OAB/SC elaborado por Rodrigo Duarte Maia, advogado, presidente da Comissão de Direito Ambiental  Subseção Bal. Piçarras da OAB/SC; e Daniel Guelli Costa, advogado, membro da Comissão de Direito Ambiental Subseção Bal. Piçarras da OAB/SC

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